Arte de chamada para a live |
Há vários tipos: preconceito racial, preconceito de gênero, preconceito social etc. No Brasil, o preconceito é, obviamente, muito forte.
Na minha visão, o crime de ódio é o medo do avanço dos pretos. Como estamos avançando no entendimento, e o sistema sabe de nosso potencial, há de se ter um jeito de frear isso antes que se avance mais.
O preconceito se manifesta nas pequenas atitudes, por exemplo: nas piadas ofensivas; na entrada do ônibus, quando as pessoas olham com medo para um preto ou preta que entre, entre outras situações. Também acontecem quando as pessoas replicam expressões antigas que, até hoje, são faladas naturalmente, e as pessoas não se dão conta, por exemplo: “criado mudo”, “pé na cozinha”, “tuas negas”, “nas coxas”, “cor do pecado”, “cabelo ruim”, “a coisa ta preta”, “denegrir”, “pessoa de cor" etc.
O preconceito reflete diretamente na saúde. No bem estar geral. Pois criamos crenças limitantes que nos impedem de viver com mais liberdade. Citei um exemplo meu: hoje em dia, as pessoas vão ao mercado com as sacolas retornáveis. Dentro do mercado, elas colocam os mantimentos na própria bolsa e, depois, passam no caixa, e retornam com os produtos para a bolsa. Eu não faço isso. Eu coloco no carrinho, e só quando passo no caixa é que abro a bolsa retornável, para que não tenham dúvidas sobre algum possível furto de minha parte.
Para enfrentar o preconceito, a primeira coisa é entender que ele existe. Para quem já entendeu, não esconder, e assumir que ele existe. Fazendo isso, não fugimos da realidade, e a encaramos de frente. Recentemente, logo após casos de assassinato como George Floyd ou o menino João Pedro, eu vi vídeos de pessoas brancas que falaram que esse “tumulto” é exagero, é palhaçada; “e se fosse ao contrário?” Essas pessoas estão omitindo uma realidade que é óbvia, e não me parecem inclinadas a resolver o problema. Nós precisamos discutir isso, e não jogar para baixo do tapete.
Sobre ser mulher negra: as negras são vistas por muitos como objeto de exportação. Tem bundão? Tem cintura fina? Sabe sambar? A preta que não sabe sambar “não é preta de verdade”. E quando a gente revela que tem estudos, geralmente surpreendemos as pessoas, porque elas esperam menos de nós, no geral. Então, se para a mulher em geral as coisas são difíceis, para a mulher negra é bem pior. Também tem a questão do cabelo, que agora está começando a ser mais aceito na sociedade, certamente por toda a pressão que tem sido feita em relação ao respeito e integridade de nossa imagem. Mas, como dito anteriormente, são fatos que estão ligados à nossa saúde e autoestima.
Sobre meus casos pessoais no preconceito, citei um: sempre sofri preconceito, e sempre vou sofrer, seja de forma disfarçada, seja de forma declarada. E posso afirmar que não sofri tanto quanto outros pretos sofrem, porque não sou preta retinta (a preta com o tom de pele mais escuro que o meu). Mas já passei por muitos episódios de racismo, obviamente. Um que gosto muito de citar foi quando eu estava no ônibus, e só tinham 2 pretos: um rapaz e eu. Os policiais entraram no ônibus e só revistaram a nós dois. Então, eu o perguntei se tinha acontecido alguma coisa na região, e se a pessoa que ocasionou a questão era parecida comigo, até porque eu precisaria me proteger. O policial não entendeu minha pergunta, e eu o expliquei que se ele revistou só à mim e ao rapaz, deveria ser porque, no mínimo, nós éramos parecidos com algum criminoso da área, e eu precisava saber o que tinha acontecido para não ser confundida. Ele ficou chateado com o meu esclarecimento e liberou o ônibus, resmungando. Eu acredito que eu sempre vá sofrer preconceitos; talvez, isso mude na geração dos meus netos, mas é uma esperança. Estamos lutando para que tudo aconteça e melhore.
Então, eu a agradeci por estar fazendo essa live e abrindo esse espaço, pois essa atitude já é uma forma de minimizar essa questão. Não digo que seja o suficiente, mas é um começo, onde a sociedade como um todo está enxergando uma questão real, se importando com ela e tentando resolver. Então, eu acredito que a forma de lidar com ela é batendo de frente, entendendo a questão da maneira mais sincera que puder; não falar pelo outro, e sim, dar a voz ao outro, respeitando o lugar de fala. E, o principal: tendo empatia, porque só se colocando no lugar do outro que a pessoa será capaz de acolher e ressignificar qualquer situação.
Ah: falamos também da luta que é fazer o adolescente entender que ele é preto ou preta, e ter orgulho disso. Na escola onde eu leciono, procuramos fazer projetos durante todo o ano, e não só no dia 20 de Novembro.
No mais... Bom, dizem que escolhemos quem seremos antes de nascer. Se for verdade, eu tenho absoluta certeza de que escolhi vir assim nessa vida, e se eu tiver que nascer de novo, certamente escolherei vir exatamente desse jeito. Quando eu era pequena, me imaginava branca e nunca gostei dessa brincadeira. Sempre me achei bonita assim, graças a Deus. E é isso!
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